REFORMAI-VOS, MAS NÃO VOS DEFORMEIS...

31 de Outubro de 2020

 Marco Sousa


"Ó insensatos gálatas! Quem vos fascinou para não obedecerdes à verdade, a vós, perante os olhos de quem Jesus Cristo foi evidenciado, crucificado, entre vós? Só quisera saber isto de vós: recebestes o Espírito pelas obras da lei ou pela pregação da fé? Sois vós tão insensatos que, tendo começado pelo Espírito, acabeis agora pela carne?" - Gálatas 3:1-3

Não restam dúvidas de que a maioria dos sistemas eclesiásticos brasileiros precisam urgentemente de uma reforma e o reconhecimento disto por parte de muitos ministros evangélicos é bastante louvável. Mas infelizmente muitos homens de Deus permitem que outros decidam por eles. O leitor deve ter em mente que em uma reforma (como o nome subentende) são deixados os alicerces. O construtor pode até quebrar uma ou outra parede, mas se demolir o edifício inteiro não será uma reforma, será uma reconstrução. Tentar demolir um edifício para reconstruir outro no lugar, sem avisar aos inquilinos que estão dentro é loucura. Tentar tulipar (calvinizar) ovelhas frágeis que fugiram do chicote em outro arraial torna o roteiro bastante cruel e fora dos padrões bíblicos, sem falar da ética e da moral humana, a não ser que demos a desculpa de que todos são depravados, utilizando (com efeito) a tão aclamada doutrina da depravação total, ao modo do determinismo calvinista.

Depois da reforma protestante, até a primeira metade do século XX, o calvinismo funcionou muito bem na Europa e nos EUA, afinal ambas as sociedades eram totalmente tementes a Deus. Qualquer teologia ou sistema religioso cristão (inclusive as seitas) servia e ainda serve como instrumento de Deus para resgatar o pecador da corrupção mundana, em qualquer sociedade fundamentada nos bons princípios morais judaicos cristãos. Hoje temos outra realidade, vivemos em uma sociedade hedonista, afundada nos lamaçais da corrupção ética, moral e avessa aos princípios da cultura judaico cristã. Neste ambiente o calvinismo é simplesmente mais um catalisador do caos e serve ao propósito de liberar o pecador à sua total depravação interior, afinal de depravação o calvinismo entende muito.

O monergismo é a doutrina calvinista que advoga que apenas Deus age no processo da salvação do homem e este não faz e não precisa fazer nada no referido processo. Inclusive, segundo a vertente calvinista, este homem salvo não teria livre-arbítrio. A Bíblia Sagrada prega o sinergismo, isto é, Deus age junto com o homem no processo da salvação (Filipenses 2:12-13 e I Timóteo 4:16). Isto não elimina a soberania de Deus e não exclui o livre-arbítrio do homem. A doutrina equivocada do monergismo, juntamente com certos aspectos totalmente equivocados da doutrina da eleição calvinista mergulharam a igreja europeia no comodismo e na miséria espiritual. Milhares de igrejas venderam seus templos para servirem de bares, cinemas, restaurantes e casas de diversão. Os crentes já não iam mais às igrejas. O que teria gerado tamanha apostasia? Os seguidores de João Calvino pregavam que a prosperidade material era um sinal claro da eleição divina na vida de alguém. A burguesia europeia amava isto e os trabalhadores comuns aprenderam também a amar esta ideia, buscando a ascenção social. O cristão protestante europeu passou a trabalhar mais para aumentar as riquezas materiais, para então “testemunhar” para a sociedade que a eleição de Deus estava sobre a sua vida e sobre a sua casa. Ser pobre era sinônimo de não ter sido eleito por Deus – Este modo de vida virou uma grande heresia. Se formos honestos com a história do cristianismo, as bases da teologia da prosperidade foram lançadas no meio protestante pelo calvinismo europeu. De forma inconsciente a união dos dois erros teológicos supracitados (monergismo e "eleição da prosperidade") criaram uma heresia venenosa a qual podemos chamar de "teologia do comodismo", na qual Deus serve ao homem que não tem livre-arbítrio e que por consequência já nasceu eleito e salvo. Esta heresia mortal tem enterrado a vida espiritual de muitos crentes. Eles não praticam aquilo que está escrito no texto de Filipenses 2:12 e ficam esperando Deus fazer aquilo que está no próximo versiculo - Filipenses 2:13.

O progressismo esquerdista, o liberalismo teológico e o hedonismo (natural do homem carnal e afastado de Deus) começaram a se alastrar pela Europa, na segunda metade do século XX. Este movimento secular e mundano encontrou a igreja acomodada, “deitada eternamente em berços esplendidos”, sem preocupações e pregando o velho jargão calvinista que derrubou e ainda continua derrubando muitos crentes: “uma vez salvo, salvo para sempre”. A igreja europeia abraçou o mundanismo, pensando que continuaria salva. A crença calvinista de que Deus predestinou os pecados dos homens (inclusive o pecado dos eleitos) também ajudou na morte espiritual do evangelho na Europa (o berço da reforma protestante).

O cristão precisa entender que Lutero, Calvino e outros reformadores, enquanto foram fiéis ao Senhor, foram instrumentos de Deus para se executar a reforma religiosa e obtiveram maravilhoso sucesso na caminhada espiritual, todavia estes mesmos homens erraram (como qualquer homem erra) e usaram o seu livre-arbítrio para cometer equívocos que são considerados abomináveis, de acordo com a ótica da bíblia sagrada e do evangelho de Cristo. Como cristãos devemos e podemos seguir o exemplo dos reformadores em sua devoção e fidelidade a Cristo, mas jamais fazer uso da violência e da acepção de pessoas, como alguns deles o fizeram. Aqui surge o problema; os crentes deterministas creem que o eleito pode matar, roubar, destruir, prostituir e cometer toda a sorte de pecados que esteja ao seu alcance que nada disto interferirá no resultado final da sua salvação. Assim, na ótica calvinista pura, Calvino e Lutero estão obrigatoriamente salvos e estiveram a serviço de Deus em tudo quanto fizeram,inclusive em seus erros absurdos relacionados à perseguição aos crentes anabatistas, bem como à ligação direta com as mortes e torturas de cristãos pertencentes a outros grupos considerados hereges por calvinistas e luteranos.

Muitos grupos calvinistas costumam usar textos de João Calvino como lupa para o entendimento do texto bíblico, do mesmo modo que os adventistas usam os textos de Ellen White, para interpretar a Bíblia Sagrada. Isto é um problema gravíssimo. O cânon do novo testamento foi fechado. Não é sábio fazer uso das palavras de um homem violento e controverso, o qual eu e você (se formos honestos intelectualmente) jamais gostariamos que ele fosse pastor da nossa igreja (se tivéssemos vivido no tempo dele). Esta constatação fica evidente quando lemos os seus próprios escritos e a biografia escrita por seus contemporâneos. O modo de vida de Calvino, suas duras palavras e ações entram em choque frontal com o evangelho de Jesus Cristo. Vejamos apenas um dentre as centenas de equívocos de Calvino que colocam em xeque sua pregação: João Calvino pregou que haverá crianças no inferno. Jesus tomou algumas crianças no colo e disse: “Deixai vir a mim os meninos e não os impeçais, pois dos tais é o reino dos céus”... É impossível para um crente bíblico, crer no calvinismo sem rasgar algumas centenas de páginas das sagradas escrituras. Há um número considerável de crentes discutindo assuntos teológicos na web, os quais creem piamente em cada palavra das Institutas da Religião Cristã (obra escrita por João Calvino), mas não creem no texto de I João 2:2. Canonizaram as institutas, mas não de qualquer maneira, colocaram-na em um nível acima das escrituras sagradas. O nome disto é idolatria.

Quando as ovelhas ficam trancadas muito tempo, sem água e sem pastagens, e perto do aprisco delas há um ribeiro de águas cristalinas que elas conhecem e amam, algo interessante sempre acontece - Quando o portão do aprisco é aberto repentinamente, as ovelhas acabam perdendo o senso (a privação de água e alimento faz isto com elas) logo elas irão beber a água suja do coxo dos outros animais, antes de chegarem ao ribeiro. De forma semelhante quando os crentes saem de sistemas religiosos fechados, eles vislumbram de forma maravilhosa os cinco solas da reforma protestante (e de fato eles são o melhor da reforma religiosa), mas logo estes crentes ficarão ocupados com as invenções heréticas e antibíblicas do calvinismo e de outros expoentes do determinismo religioso. Logo aparecerá algum pregador tentando lhes empurrar goela abaixo os controversos cinco pontos do calvinismo e a doutrina extra bíblica do lapsarianismo (ensino que afirma que Deus decretou a queda de Adão e teve prazer nisto). Sair de uma arapuca e entrar em outra é coisa de pássaro inexperiente ou de crente que aceita qualquer coisa que os crentes de Beréia não aceitariam (Atos 17:11).

Tudo quanto qualquer cristão pregar ou praticar que não se enquadre nas escrituras deve ser rejeitado imediatamente (O próprio Lutero ensinou isto, de forma correta). Neste aspecto o grande teólogo João Calvino, venerado e idolatrado por muitos crentes, não serve de modelo de vida cristã. Como cristão eu devo imitar o apóstolo Paulo, que parou de perseguir os crentes e consentir com a morte deles depois que se converteu a Cristo no caminho para Damasco, mas não posso imitar João Calvino que passou a ser mandante de assassinato e torturas contra crentes que pregavam contra o batismo infantil, depois que ele se "converteu" e tornou-se pastor em Genebra, na Suiça. A Bíblia Sagrada nunca legitimou as ações de homens que usam a violência contra seus irmãos: "Nisto são manifestos os filhos de Deus, e os filhos do diabo. Qualquer que não pratica a justiça, e não ama a seu irmão, não é de Deus" - 1 João 3:10 - O evangelho de Cristo (pregado por Paulo) transforma e regenera o pecador, o "evangelho" calvinista parece encaminhar o pecador para a depravação. Vejamos um exemplo claro de como o pensamento calvinista deturpa o caráter de Deus: O famoso teólogo calvinista James White em um debate com Hank Hannegraaf e George Bryson afirmou que quando uma criança é estuprada foi Deus quem determinou esta barbaridade. O teólogo estava apenas reafirmando o ensino calvinista, segundo o qual Deus determina tudo, inclusive todos os pecados dos ímpios, como também os pecados dos seus eleitos, para louvor da sua glória. Se o homem não tem livre-arbítrio Deus tem que ser obrigatoriamente o autor do pecado e neste caso os hipercalvinistas (calvinistas mais radicais) estão absolutamente corretos em suas análises, isto é, a anulação do livre-arbítrio torna Deus o autor do pecado. O problema é que eles creem nesta heresia anti-bíblica. Este é o resultado final da negação do livre-arbítrio, algo que os bispos sucessores de Pedro, Paulo e João refutaram em seus escritos, contra alguns filosofos que queriam espalhar o determinismo na igreja primitiva. (Vide a nota 3 - nas referências bibliográficas abaixo).

Há calvinistas mais brandos, que jogam aquilo que não conseguem explicar na economia de Deus, mas o fato é que muitas destas coisas estão postas de forma clara e inequívoca nas escrituras, de maneira que qualquer pessoa leiga consegue entender. Deus fez questão de deixar o caminho bastante claro aos olhos do pecador, mas alguns teólogos calvinistas complicam as coisas desnecessariamente. Se o cristão comum e leigo disser que isto é loucura, o teólogo calvinista distorcerá o texto bíblico e dirá que o cristão comum não teve o alcance pleno da revelação de Deus e jogará no peito dele o texto de I Coríntios 2:14-16, distorcendo-o, do mesmo modo que as seitas fazem quando os fiéis questionam a fuga dos líderes para fora das escrituras.

O livre exame das escrituras (liberdade de ler, examinar e entender) é fundamental na vida do cristão. Quando Cristo diz "Guarda o que tens para que ninguém tome a tua coroa" fica subentendido que o homem só pode guardar aquilo que tem em mãos e se alguém lhe tomar algo terá que ser aquilo que está em seu poder (o pronome possessivo “tua” se encarrega de ratificar isto), mas certas teologias equivocadas (vindas do inferno para confundir os homens) andam dizendo que se o homem perdeu é porque ele nunca teve. O “Jesus calvinista” não é confiável, é um brincalhão que gosta de teatro. O Jesus bíblico, aquele que se apresentou aos seus servos e que não precisa da apresentação de João Calvino sobre a sua pessoa, aquele que morreu no calvário, para perdoar os meus pecados e que triunfou sobre os principados e potestades, aquele que veio salvar o mundo e não condená-lo (Vide João 3:16-17) não tem compromisso algum com o determinismo estóico pregado por muitos crentes da atualidade. O meu Jesus (o da Bíblia e não aquele pintado por João Calvino) disse: “(...) Se alguém quiser vir após mim, renuncie-se a si mesmo, tome sobre si a sua cruz, e siga-me”– Mateus 16:24 – A proposta foi feita a quem quisesse (ELE nunca obrigou ninguém a servi-lo), eis aí o livre-arbítrio que Deus deu aos homens, mas os pregadores falam em graça irresistível. São muitas invenções extra bíblicas que solapam a tão aclamada sola scriptura.

Certa vez Jesus disse aos chefes religiosos de Israel: “Mas ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! Pois que fechais aos homens o reino dos céus; e nem vós entrais nem deixais entrar aos que estão entrando”  - Mateus 23:13 - Se Jesus fosse calvinista bastaria ele correr e despejar um balde de graça irresistível nas pessoas as quais os fariseus estavam impedindo de acessar o reino, mas, ao contrário disto, ele aconselhava os seus discípulos a terem cuidado com o fermento dos fariseus. Depois que o fermento estranho cai na massa a melhor coisa a se fazer é jogar o pão fora e fazer outra massa...

A SOLUÇÃO SIMPLES E EFICAZ

Voltemos ao evangelho bíblico de Jesus Cristo e abandonemos a calvinolatria. Falsificar a palavra de Deus é pecado grave! Reformai-vos, mas não vos deformeis...

Glória ao Pai, Gloria ao Filho e Glória ao Espírito Santo!

REFÊRENCIAS

1 - Os artigos utilizados na elaboração deste texto estão listados nesta página sobre o tema ►Cristianismo Bíblico X Calvinismo - https://www.doutrinafiel.com.br/p/calvinismo.html
2 - Bíblia Sagrada Almeida Revista e Corrigida Fiel – 2007 – Sociedade Bíblica Trinitariana do Brasil.